quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Cuidado!

Não.
Não posso mais.
Juro que não suporto
essa metafísica das palavras.
Tudo o que quero
é a Leveza.
Desejo tocar a Suavidade
com os lábios,
ser engolida por um céu
azul claro
que torna desta cor
tudo o que toca.
E então eu seria composta
da mesma cor que esse
céu engolidor, e as árvores
tornariam-se da mesma tonalidade
que eu e o sol seria azul claro
juntamente com o chão.

Não.
Não posso mais.
Juro que não suporto
o peso dessa indeglutível angústia.
Sensação que trava a garganta,
deixa os olhos
enevoados,
aperta meu peito e dificulta
a respiração.
Eu só quero a luz.
Uma Luminosidade que
me faça levitar,
adentre em mim através
dos ouvidos com a
impetuosidade de quem
já é dono
e ilumine minha nuca.
E meus cabelos serão puro brilho.

Não.
Por favor, não posso mais!
Eu não suporto! não suporto
a dureza da realidade que
chuta minha porta
todos os dias pela manhã e
atira-me para fora da cama
sem nenhuma delicadeza.
Estou soterrada em escombros
do que seria o meu mundo.
Não posso mais.
Desejo sentar-me na terra
assassinar formigas,
comer flores
e redefinir os meus contornos.
Eu só quero paralizar
todos os relógios
e respirar.
Preciso de tempo, (Ou preciso da ausência do Tempo?)
pois o espelho que está
em minhas mãos
não reflete nada além de
frangalhos.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Lucidez

Um cheiro abafado de
flores esmagadas
acompanha-me
sempre.
E me sufoca juntamente
com essa lucidez
que nunca me abandona.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Humanamente bicho

Sou algo que veio sem
perceber;
Sou medo, sou tinta, sou
massa, sou terra, sou saudade;
Respiro; vento; morro em
mim, ressurjo em você e
vejo, clamo; chamo a
chama que arde no fundo
dos meus olhos, por dentro
da minha garganta.
Corro, grito, choro. Respiro
mais. Me escondo e
mastigo as folhas verdes das árvores altas que mal consigo
alcançar.
Esmago as folhas secas com pés descalços que cheiram tristemente
a rosas murchas.
Me engulo. Me regurgito. Me esparramo no chão e
sou mato, sou flor, sou chuva e sou eu: vários
eus de mim.
Sigo em minha busca fundindo-me ao mundo e observando-o
de longe. Tenho em mim todas as moléculas da terra.
Humanamente bicho,
Sou tudo e sou nada.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Mon coeur il a la couleur de tes yeux

Meu coração tem a
cor dos teus olhos
refletidos numa
poça d'água.

Meus olhos têm
o cheiro do teu
corpo desbravado
pelo meu olhar.

Minhas mãos têm
o gosto dos teus
poros.

(Me liquefaço
e te adentro
através deles)

Minhas narinas ouvem
o timbre do roçar
dos teus cabelos
em minha boca;

e estremeço.

Há tanto de ti
em mim
que emudeço.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Ressaca de lágrimas

Ontem bebi demais,
muito além do necessário.
Sorvi mais do que poderia
extrair
de todas as garrafas do meu bairro
pois,
a fonte da qual eu bebia
era fonte inesgotável.
Eram meus olhos que produziam
lágrimas que despencavam
salgando meu rosto,
invadindo meus lábios.
Afogando-me na bebida
quente.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Eu

Fruta podre que cai da árvore,
Vida corroída pelo tempo,
Pó envelhecido de mármore,
Uma folha seca indo no vento.

Belo vaso, rachado, de flores;
Para não despedaçar-se, finge:
Não estão mortas todas as dores
Dos longínquos olhos de esfinge.

Pálido tédio incomunicável
Gélido e plácido como a lua,
Seca o sentimento mais amável;

Minha existência é assim, crua.
Enorme absurdo inexorável,
Esfacelo-me imóvel, nua.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

As horas


Relógios.
Minha vida está
cheia,
repleta,
infestada
de relógios.
Me apresso,
esqueço,
corro sempre
com os relógios.
Para os relógios.
Reloginhos bem
pequenos brotam
dos meus poros;
são de todos os
tipos.
Antigos.
Futuristas.
De pulso,
de corrente,
de parede.
(Até ampulhetas!)
Mas são relógios
que
Tocam, despertam, badalam
na minha cabeça.
Minha vida está cansada de relógios!
Ou desapareço
Ou me transformarei – também eu – em um grande relógio.
Grande, enorme, ambulante;
Cheio de ponteiros e despertando a cada instante...

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Cores

Hoje meu dia amanheceu
roxo pálido
para combinar
com minha melancolia.
Essa melancolia viscosa,
escura, densa.
Que me engolfa
e me enoja,
que regurgito
e engulo novamente.
A tarde foi, para mim,
cinzenta,
afogada na solidão
boiando
longe dos meus semelhantes...
Indo embora, arrastada
nas correntezas do tédio
verde-musgo.
Vestida de monotonia.
De olhos abertos,
gelatinosamente abertos
e azulados.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Medo

... E o medo,
esse meu tão viscoso companheiro,
me submerge e me sufoca e me maltrata.
Vagueia comigo, brinco com ele,
ele me estica, me amassa e
gruda em mim.
Está tudo escuro : existe
uma cortina em volta
do meu pescoço. A lua
nunca mais sairá detrás
das nuvens.
E o medo é o único que
passeia ao meu lado,
caminha junto a mim, dentro de mim e sobre mim.
Me invade. Circula em minhas veias com
meu sangue e entra em meus
pulmões junto com o ar:
Sai do meu interior em forma de vômito.
Já não sei mais quem é o medo e quem sou eu.